“Por que dura a minha dor continuamente, e a minha ferida me dói e
não admite cura? Serias Tu para mim como um ilusório ribeiro, com águas
que enganam?” Jeremias 15:18
A angústia do profeta Jeremias é marcada por interrogações, ele vive um
momento de crise na fé. Um homem de Deus, escolhido desde o ventre
materno, com um relacionamento intimo e real com Deus, como poucos em
sua geração, como poucos nesta vida. A angustia tinha agravante na
corrupção e sofrimento de uma nação sendo levada em cativeiro, e nesse
momento, Jeremias questiona sobre perdão, bondade e misericórdia. Ele
não quer admitir que um Deus bom e justo possa retribuir mal com mal.
Estaria ele enganado, iludido sobre Deus?
Jeremias em seus questionamentos revive um antigo enigma teológico: “Por
que um Deus bom permite que coisas más aconteçam?”. O mal no contexto
aqui exposto é consequência do pecado de uma nação. O declínio e morte
de Israel era uma correção, o cumprimento de uma sentença contra a
ausência de moral, de temor. Era difícil compreender, mas mesmo naquela
catástrofe Deus agia com amor, o mal do cativeiro era necessário para
prevalecer o bem, um bem maior.
Mas nem todo o mal é consequência do pecado, um exemplo? Jó. Sofreu
horríveis males: luto, enfermidades, solidão, injustiças sociais,
calúnias e também viveu suas crises: “Quantas culpas e pecados tenho eu?
Notifica-me a minha transgressão e o meu pecado” Jó 11:23. Jó não
compreendia o porque de tanta desgraça; seria ele mesmo a origem do
mal?
Habacuque foi outro que colocou interrogações sobre o mal moral que dominava os homens em sua época: “Tu que és tão puro de olhos que não podes ver o mal, e que não podes contemplar a perversidade, por que olhas para os que procedem aleivosamente, e te calas enquanto o ímpio devora aquele que e mais justo do que ele?.Habacuque 1:13.
O teólogo Karl Barth analisou o “problema do mal” e discorreu: “Explicar
o mal é eliminar o escândalo” . E o filosofo Paul Ricouer
surpreendentemente lança seu argumento otimista sobre o mal (quanto
sofrimento humano e quanto catástrofes naturais): “Crer em Deus apesar de...A despeito de todo o mal, é uma maneira de integrar paradoxos especulativos”.
Eu diria que é impossível não vivermos crises, elas são até necessárias,
porque as respostas sucedem a interrogações e a fé é regada nas
aflições. O Cristo veio em aflição e sofreu as dores desse mundo vil e
terreno e muitos homens e mulheres cheios de fé, padeceram males:
“Experimentaram escárnios e açoites, e até cadeias e prisões. Foram
apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram
vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e
maltratados (Dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, e
montes, e pelas covas e cavernas da terra. ”Hebreus 11:36-38
O problema do mal - e entenda-se por mal as muitas facetas da destruição
que elimina a edificação da felicidade: mal humano, barbárie, cósmico,
espírito, ente... - além de se relacionar com a ideia de Deus, diz
respeito ao próprio homem. Como viver o livre arbítrio sem a opção de
escolher entre contrastes? Como descobrir a fé e fazer parte da
Redenção? Essas coisas só se tornam possíveis porque existe bem e mal.
Os heróis da fé só foram assim denominados porque buscaram e acreditaram
em um Deus, apesar de... (como diz Ricouer)
Acreditar em um Deus bom e justo e não saber explicar o porque do
sofrimento não elimina o escândalo, mantêm as crises e revela a fé. Crer
em Deus pelo que Ele é, independente do que se sofre. Crer porque o mal
é uma passagem e o Bem é eternidade. Crer porque não compreendemos e
essa limitação nos traz a consciência de que precisamos crer. Crer
porque dúvidas são reflexos da existência, mas a existência é maior que
toda dúvida quando Deus habita em nós.
http://www.atendanarocha.com/2016/06/reflexao-sobre-momentos-de-crises.html#more
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