Muito da
prática cristã ultimamente tem sido moldada a partir de alguns
conceitos que envolvem explicita ou implicitamente a noção de
merecimento. A ideia de que merecemos ou temos o direito ao favor de
Deus. O que mais impressiona é que tal afirmativa seria considerada
um ultraje se aplicada a um não convertido, mas quando é aplicada a
um convertido passa a ganhar outros contornos mudando seu status de
mentira para verdade revelada.
Onde
percebemos essas ideias? Não é difícil encontrá-las por aí, no
meio da cristandade, soltas e espalhadas em meio a uma
espiritualidade superficial e mística. Um famoso pregador inicia sua
oração dizendo: “Se tenho crédito contigo, ouve mais essa
oração...” um outro incita a “tomarmos posse de nossos
direitos” e esse “tomar posse” já virou jargão entre os
crentes. Vez por outra vemos pessoas dizendo “tomo posse” e ainda
temos que suportar alguns “conselhos” tipo: “tome posse da
bênção irmão!”, “exija seus direitos!”, “ordene que a
situação mude!”. O fato é que essas ideias de que temos
“crédito” no céu impregnaram o povo evangélico no Brasil.
Não
conseguimos conceber o uso de tais imperativos por parte da criatura
quando o assunto é relacionamento com o Senhor e nem mesmo encontrar
algum “crédito” que possamos ter no “banco” Deus do qual
possamos em determinado momento “sacar” alguns trocados e isso
porque tais conceitos não são bíblicos, simplesmente. Talvez tais
pensamentos tenham mais fundamento nos princípios psicológicos do
que teológicos e tenham adentrado na igreja junto com a
“psico-teologia” que nos inunda na ocasião. O maior problema com
toda essa postura está no fato de que considerar o “merecimento
humano” colide com a dádiva da graça de Deus.
Isso não
vale apenas para não crentes, os crentes não mudam seu status
(neste sentido) após a salvação, ou seja, o crente não passa a
ser merecer após a salvação. Ele continua a não merecer as
benesses de Deus. “Assim também vocês, quando tiverem feito tudo
o que lhes for ordenado, devem dizer: 'Somos servos inúteis; apenas
cumprimos o nosso dever'”. Lc 17.10. Penso que é claro esse ensino
de Cristo. Em outras palavras Ele queria dizer que é próprio do
servo servir. Não fazemos nada de extraordinário quando servimos ao
Senhor a ponto de termos merecimento a recompensas.
O ponto
chave é termos uma visão correta da graça de Deus e a partir disso
sermos moldados em nosso relacionamento. Assim, passamos a entender
que pela graça Deus dá a todos “a vida, o fôlego e as demais
coisas” - At 17.25-26, Ele salva - Ef 2.8 e Ele traz a fé - Rm At
18.27. Também entendemos que os dons do Espírito são pela graça -
1Co 12.11, a santificação operada em nós é pela graça - Fl 1.6,
a vida cristã é desenvolvida pela graça, pois é Deus quem efetua
em nós o querer e o realizar - Fl 2.13.
Em
nenhum aspecto a obra de Deus é executada em outra base a não ser a
graça. Ele não é coagido ou pressionado a fazer nada e só realiza
o “desejo” de sua vontade. Dessa forma precisamos corrigir alguns
mitos. O primeiro é pensar que nossas muitas e longas orações
“forçam” Deus a nos responder. Talvez você não gostará do que
vou dizer, mas realmente Deus não age porque estamos orando! O
pensamento é o contrário, só estamos orando porque Deus
primeiramente já nos favoreceu com sua maravilhosa graça e nos
despertou para Ele. E tem mais, não sabemos orar como convém e quem
é que intercede por nós, ou seja, quem é que ora por nós? O
Espírito Santo e o Senhor Jesus Cristo, ou seja, o próprio Deus!
Isso mostra que nossas orações estão longe de, por si mesmas,
serem suficientes para conquistarem bênçãos. O segundo mito está
associado a uma espécie de humanismo. Acreditamos que nosso choro
“move” o Senhor a tomar providências. Outro engano. Muito ou
pouco choro (em si mesmo) não tem grande valor. Prova disso é que
você já deve ter chorado muito e sinceramente diante do Senhor e
nada ter acontecido por diversas vezes. Muitos cristão ficam até
abalados em sua fé quando não veem suas lágrimas sendo enxugadas.
Mas, novamente insistimos em afirmar que Deus não é coagido a agir
por causa dessas circunstâncias e às vezes o próprio choro é
providência divina. Outra crendice é pensar que aqueles longos
períodos de fome que alguns crentes dizem ser jejum acrescentam
poder e graça ao crente diante de Deus. Ledo engano. E, por último,
não pensemos que nossos dízimos e ofertas nos autorizam a exigir
riquezas. Eles não são depósitos bancários feitos em paraísos
fiscais, pelo contrário, aqueles que não entregavam o dízimo (em
um tempo atrás) foram chamados de ladrões. Então, o dízimo
(contribuições) está, na verdade, mais associado a uma dívida e
obrigação do que uma aplicação que deva render a 100 por 1!
Enfim,
toda nossa existência é produto da graça de Deus em nós e não do
nosso próprio mérito. Esse posicionamento exalta ao Senhor e se
coaduna com outras doutrinas fundamentais como a Soberania (se Ele é
soberano não deve nada a ninguém), Onisciência (como aquele que
conhece tudo, tem inteligência para agir em conformidade com seu ser
soberano), Onipotência (Só Ele tem todo poder para sustentar a
criação) e Providência (Ele é quem provê toda a criação).
fonte:http://teologiacritica.blogspot.com.br/search?updated-max=2012-07-12T13:31:00-04:00&max-results=30&start=5&by-date=false
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